19/03/13

Há dois anos...

Acordei com uma sensação esquisita, desconhecida.
O Dono disse: "Precisas é de comer qualquer coisa, vou preparar-te o pequeno-almoço." (O homem conhece-me bem, o que posso dizer?)
Eu fui à casa de banho. Era um caminho que conhecia bem, era o único que tinha percorrido nos últimos meses, acamada que estava desde muito cedo na gravidez, e percorrera-o tantas vezes como só as grávidas que me estiverem a ler compreenderão. E eu nesse dia estava já muito grávida, tão grávida que não via os pés, tão grávida que tinha uma cesariana marcada para daí a 48 horas.
Não demorou muito até que percebesse que algo estava a acontecer. Não há cena de filme nem curso de pós parto que realmente nos prepare para quando chega a nossa vez, mas ajudam. Chamei o Dono: "Cancela o pequeno-almoço, rebentaram-me as águas."
Houve um pequeno instante de "Não era suposto ser assim", acho até que choraminguei e deitei as mãos à cabeça. Afinal, tinha passado os últimos meses a servir de incubadora, quietinha numa cama para a pipoca não saltar cedo demais, e depois passara as últimas semanas a dar voltas à cabeça para escolher uma data para a cesariana porque a pipoca não poderia nascer de parto natural, e portanto achava que as coisas deveriam ser de uma certa maneira que não aquela. E além disso a culpa era das hormonas. A culpa é sempre das hormonas, ok?
Ali, na casa de banho, na mesma casa de banho onde tínhamos descoberto juntos que íamos (finalmente) trazer uma vida ao mundo, descobrimos que esse momento tinha chegado. O Dono abraçou-me emocionado, tal como uns meses antes, e disse. "Mas é assim que vai ser e vai ser espetacular."
E foi. Tem sido. E vai continuar a ser.

Ele ajudou-me a vestir-me e a calçar-me (um pormenor importante), depois eu fui fazer uns telefonemas. Primeiro para a maternidade conforme tinha sido instruída a fazer se entrasse em trabalho de parto antes da data da cesariana, para que pudessem mobilizar a equipa para uma cesariana de emergência. Depois para o meu obstetra, que me tinha avisado que aos fins de semana estava sempre fora de Lisboa e precisava do máximo aviso prévio para chegar a tempo. Depois para a minha mãe, que estava a fazer arroz doce para o almoço do Dia do Pai que estava marcado. Depois para a minha sogra, para a avisar que o almoço do Dia do Pai teria de ser no hospital. Depois reuni os últimos exames e pu-los ao pé da mala há muito preparada, repreparada, mexida e remexida, cheia de roupinhas cor de rosa e botinhas tricotadas com amor e sonhos e princípios.

O que fez o Dono no entretanto? Passeou os cães, claro.
Bom, e também forrou o banco do carro com sacos do lixo. Porque nunca conheci ninguém tão calmo em momentos de stress, e tão prático... e tão cocózinho com o carro. E porque no curso pré-parto nos tinham dito que o líquido amniótico cheirava a esperma (mas eu acho que cheira a lixívia).
E depois demos umas festinhas aos cães e fomos conhecer a Danoninha.

O Dono conduziu que nem um doido, até porque as contrações entretanto começaram, em força e pouco espaçadas, do género "vou ter a bebé mesmo aqui". Eu morria de vergonha pelas manobras que ele fazia e punha-me a fazer aquelas respirações do parto na esperança que as pessoas nos outros carros percebessem que não éramos doidos, éramos apenas grávidos em trabalho de parto.
Soube depois que os meus pais e os meus sogros também fizeram algumas manobras pouco recomendáveis, mas avós que se prezam estão na sala de espera histéricos, não é verdade?

Do parto propriamente dito só tenho boas recordações. O anestesista tinha uma toca com pegadas de animais, o que imediatamente me fez desatar a falar sobre os cães. Depois ele pôs música clássica, o que me imediatamente me fez refilar, até que ele pôs Muse. Sim, a Danoninha nasceu ao som de Muse.
Eu falei sobre TUDO o tempo TODO.
Escusado será dizer que, numa maternidade pequenina onde só havia mais 2 ou 3 grávidas penso eu, no dia seguinte já toda a gente sabia quem eu era. Era a tagarela, com a filhota de lindos casacos tricotados à mão e muitas visitas enfiadas no quarto.
 
Nos dias em que fiquei internada na maternidade, o Dono nunca ficou lá connosco para que os cães não ficassem sozinhos e os seus horários de passeio e alimentação fossem alterados ao mínimo. Todos os dias quando se ia embora o Dono levava peças de roupa sujas da bebé para dar-lhes a cheirar e depois espalhar pela casa para criar habituação, tal como nos tinham aconselhado.
E sim, deve ter-lhe custado imenso não poder lá ficar connosco. E sim, a Emma substituiu-me na cama.

Fomos para casa no dia 22, o Dono levava a Danoninha no ovo e eu entrei primeiro e os cães fizeram-me uma grande festa. Depois pousámos o ovo e deixámos que eles conhecessem a minúscula bebé à maneira deles. O Sushi nunca ligou nem stressou muito, e formulámos a teoria de que na vida anterior dele (a vida que teve antes de ser nosso e da qual nada sabemos) já tinha convivido com crianças. A Emma ficava agitada com o choro, vinha-nos chamar, quase que revistava as visitas que chegavam. Fiéis a si próprios, portanto.

Passaram-se dois anos e a Danoninha tem crescido linda, esperta e saudável. Pergunta pelos cães, faz-lhes festinhas, refila com eles. No mundo dela nem sequer se concebe outra realidade que não a de ter dois monstrengos a coabitar com ela e a mamã e o papá. Eles fazem parte do dia a dia, das coisas que lhe ensinamos, dos valores, responsabilidades, enfim... da vida em família.
Ter filhos e cães não é nenhum drama. Exige alguma ginástica, para conciliar horários, passeios, atenção, limpeza, brinquedos. Mas não é nenhum drama. É, aliás, muito muito muito muito FIXE!




2 comentários:

Blog da Pink disse...

Fiquei emocionada com o relato de um momento tão lindo na vida de um casal. Muitas felicidades, saúde e alegrias na vida da Danoninha e toda família! O meu primogênito acabou de se formar engenheiro mas parece que foi outro dia que eu estava assustada com as contrações e ansiosa por ver o meu bebê tão lindo e cabeludo!
Beijos
Laís

Lígia disse...

Adivinha o que fiz enquanto lia o teu post? :P Pois claro que lacrimejava feita doida!
Porque é assim que eu também sou. Porque é assim que deve ser. Por tudo e mais alguma coisa ainda!

És muito como eu, és uma fixe, pah :D

P.S - Eu também quero um anestesista com uma touca com pegadas de animais!!